Thursday, October 4, 2012

Pejë - Peć

Os traços Otomanos são muito visíveis nas ruas da cidade de Pec

A cidade de Pejë foi uma cidade fortemente afectada pela Guerra do Kosovo como a maior parte das cidades do Kosovo. Historicamente trata-se de uma cidade com enormes influencias Otomanas e ainda com muita população de origem turca sendo no entanto de grande maioria albanesa. Da população sérvia existente antes do inicio da guerra sobram apenas as freiras residentes no Patriarcado de Peć, um dos maiores bastiões da Ortodoxia Sérvia, que se encontra ainda hoje sob protecção das forças da KFOR .

História

O nome da cidade de Peć, em albanês Pejë, apesar de esta já existir desde a era Romana, tem precisamente origem na palavra sérvia Peć que significa gruta numa alusão às grutas existentes na cadeia montanhosa de Rugova às portas da cidade, que serviam de abrigo aos montes ortodoxos na Idade Média.
O Patriarcado de Pec situa-se junto às margens do rio
O domínio Sérvio desta cidade nas margens do rio Pećka Bistrica, tem inicio em 1180 quando Stefan Nemanja a conquistou ao Império Bizantino. Mais tarde, a cidade seria doada bem como as aldeias vizinhas ao recém fundado Mosteiro de Žiča, que era um dos Arquibispados Sérvios e que por isso levou a que Peć passasse a estar sob domínio dos Arcebispos e posteriormente Patriarcas.
Peć ganharia importância quando, após a destruição do Mosteiro de Žiča pelos Turcos, por volta de 1280, a diocese foi transferida para a cidade onde permaneceria até à abolição do Patriarcado Sérvio no ano de 1766.

Para se chegar ao interior do complexo do mosteiro é preciso passar pela barreira de segurança das tropas da KFOR

Durante este período Peć tornou-se num importante centro religioso da Sérvia medieval após o Czar Sérvio Stefan Dušan declarar a cidade como a sede da Igreja Ortodoxa Sérvia, em 1346. Peć assegurou este estatuto até 1766, ano em que o Patriarcado de Peć foi abolido, no entanto a cidade ainda alberga nos dias de hoje o Patriarcado da Sérvia.
Entrada da mesquita de Bajrakli
Capturada pelos Otomanos no final do século XIV, começaram a ser operadas muitas mudanças em Peć desde então, começando pelo nome que foi mudado para Ipek. A cidade passou a ser habitada por um grande número de população turca da qual ainda restam muitos descendentes nos dias de hoje e foi reconstruída de acordo com os padrões Otomanos que chegaram aos dias de hoje. Todavia a maior mudança operada na cidade foi a religião passando a maioria da população a ser muçulmana ao mesmo tempo que foram construídas na cidade várias mesquitas, muitas das quais ainda hoje existem como a mesquita Bajrakli construida no século XV.
Após um período, durante o domínio Otomano, em que a cidade deixou de ter uma especial importância, Peć voltaria a fazer parte do mapa dos Balcãs quando ali foi estabelecida a Liga de Pejë, uma associação de patriotas Albaneses, liderada por Haxhi Zeka, que como a Liga de Prizren, almejava defender os direitos dos Albaneses dando-lhes um estatuto de autonomia dentro do Império Otomano.
Zona da Qarshia ou bazaar de Peje
Um conflito armado de curta duração com as tropas Otomanas em 1900 fez com que a Liga de Pejë desse por concluídas as suas operações, no entanto a cidade nao estaria muito mais tempo sob domínio Otomano. Os 500 anos de domínio Otomano em Pejë chegariam ao fim na sequencia da Primeira Guerra dos Balcas, entre 1912 e 1913, a partir do momento em que as tropas Montenegrinas entraram na cidade.
Estátua em Honra de Adrian Krasniqi

Depois de ter estado sob domínio do Império Áustro-húngaro, em 1915, a cidade passou a integrar o Reino da Jugoslávia no final da I Guerra Mundial. A cidade ainda passou a estar sob domínio Albanes durante um pequeno período da II Guerra Mundial, voltando a fazer parte, agora da Federaçao da Jugoslávia no final da guerra como parte integrante do Kosovo e Metohija, uma provincia autónoma da República Popular da Sérvia.
As relaçoes entre Sérvios e Albaneses, que constituem a maioria da populaçao da cidade, foram sempre tensas até ao estalar da Guerra do Kosovo, em 1999, que destruiu parcialmente a cidade causando a milhares de pessoas.


Diário de Viagem
  
Cheguei à cidade de Pejë ao entardecer de um frio e nevado dia do mês de Março de 2012. A minha primeira impressão foi que se tratava de uma cidade com inúmeros traços arquitectónicos Otomanos nomeadamente no seu centro histórico. No entanto era já tarde e optei por ir jantar deixando o dia seguinte para explorar melhor a cidade e principalmente o Patriarcado de Peć, um dos berços da religião Ortodoxa Sérvia, situado em pleno Kosovo.

            A cerveja Kosovar é a Peja, oriunda da cidade de Peje (esq) Prato de fast-food albanesa que comi em Peje (dta)

Na manha seguinte optei por me levantar cedo de forma a visitar o centro da cidade e ainda o Patriarcado de Peć sendo que o único autocarro diário rumo a Mitrovica, a cidade para onde me dirigia depois, era às quatro da tarde.

                   Existe um grande contraste arquitectónico entre a parte mais recente da cidade e a sua zona histórica

Eram as primeiras horas de um Domingo muito frio e por isso as ruas estavam quase vazias e as lojas fechadas bem como as mesquitas. Na parte mais recente da cidade a arquitectura é de estilo Jugoslavo com as rígidas linhas que caracterizam os edifícios da época comunista mas à medida que nos aproximamos do centro histórico surge o estilo Otomano com as características zonas comerciais ladeadas por inúmeros minaretes das vizinhas mesquitas.

           A cidade de Peje, como quase todas as cidades do Kosovo foi arrasada pela guerra e está ainda em reconstrução

Bem no centro da zona histórica situa-se a mesquita Bajrakli construída no século XV durante as primeiras décadas de ocupação Otomana. Esta é a principal mesquita de Pejë sendo que é através de uma bandeira colocada no seu minarete que as outras mesquitas da cidade estão autorizadas a começar as suas orações. Não consegui no entanto entrar no interior da mesquita porque esta se encontrava encerrada devido a ser Domingo, ou devido a ser muito cedo.

      A data de construção da mesquita de Bajrakli não é exacta supondo-se que remonte à segunda metade do século XV

Uma das torres dos sinos do Mosteiro
Depois de circular um pouco pelo deserto centro da cidade optei por me dirigir ao Patriarcado de Peć, onde fui recebido à entrada por um contingente Esloveno da KFOR que me pediu o passaporte e me perguntou porque desejava visitar o mosteiro. Só depois de confirmarem todas os dados do passaporte e de responder-mos às suas questões nos disseram que iam telefonar à Madre Superior, ou seja a freira superior daquela congregação, a perguntar se nos poderiam deixar entrar. 
A senhora não atendeu o telefone, o que o militar me disse ser normal porque muitas vezes não desejava ser incomodada, mas mesmo assim deu-me um cartão de "visitante" e avisou-nos de que poderíamos entrar porque quando a senhora não deseja turistas no mosteiro ela própria telefona aos militares a dar essa informação. De qualquer das formas fomos avisados de que era interdito tirar fotos uma vez no interior do complexo do Patriarcado, daí as fotos que apresento no blog tenham sido fotografias tiradas com o telemóvel e sem muita preparação por isso não com a qualidade desejada.
 
                   A entrada do mosteiro (esq) Eu com o cartão de visitante que me foi dado pelos militares à entrada (esq)

O Patriarcado de Pec trata-se de um complexo de igrejas medievais construídas entre os séculos XIII e XIV. Tratam-se de quatro igrejas construídas próximas da margem do rio Pecka Bistrita ás portas de Peć que constituem a sede espiritual e mausoléu de todas os Arcebispos e Patriarcas Sérvios e onde se podem observar vários estilos de arte medieval Sérvia
Escadaria para os aposentos do Mosteiro

Apesar de uma grande repressão por parte dos Otomanos que forçou o Patriarca Arsénio III a deixar Peć juntamente com vários famílias emigrando para o sul da Hungria no final do século XVII, o mosteiro foi preservado tendo chegado aos dias de hoje.

Após o final da II Guerra Mundial o Patriarcado de Peć foi convertido num convento e hoje é ainda um dos maiores e mais importantes centros da Ortodoxia Sérvia na região albergando 24 freiras.
Durante séculos foram educados no mosteiro monges talentosos que preservaram e decoraram as igrejas ao longo dos séculos, até ao século XVIII. Os frescos existentes estão datados desde o século XII até ao século XVIII sendo que os pintores que trabalharam em Peć no século XIV tentaram reproduzir o mesmo estilo iconográfico do período do auge da Sérvia medieval.

                                       Os frescos do Patriarcado de Pec datam desde o século XII ao século XV

O tesouro do Patriarcado de Peć é um dos mais ricos de toda a Sérvia medieval mesmo que muitas peças se tenham perdido ou danificado ao longo dos séculos. A última vez que o mosteiro esteve em risco foi durante o incêndio causado por extremistas albaneses em 1981 sendo que a área residencial do mosteiro ardeu tendo sido depois recuperada.
O mosteiro tornou-se, depois da Guerra do Kosovo, o mais importante centro dos Sérvios que ainda residem na zona nos vizinhos enclaves de Gorazdevac e Osojane



Como Chegar

As tropas da KFOR à entrada do Patriarcado de Pec
Quando me desloquei à cidade de Pejë parti desde a vizinha cidade de Prizren, sendo no entanto que a cidade de Pejë se encontra bem ligada por redes de autocarros às cidades de Prishtinë. Para quem vem de fora do Kosovo, a melhor forma é chegar até à capital Prishtinë a partir de qualquer cidade dos Balcãs que não se situem na Sérvia ou no Montenegro e dali apanhar um autocarro até Pejë.
As estradas foram reconstruidas após a guerra apresentando por isso boas condições de circulação. Uma vez na cidade, para chegar até ao Patriarcado de Peć pode optar-se entre apanhar um táxi desde o centro da cidade, tendo em conta que os taxistas serão sempre albaneses e poderão recusar-se a levar-nos até ao Patriarcado. A outra hipótese é caminhar cerca de 40 minutos até ao Mosteiro que se situa já fora da cidade. Para entrar no mosteiro é necessário Passaporte sendo que este se encontra protegido pelas tropas da KFOR que nos pedem os documentos antes de nos deixarem entrar.

1 comment:

  1. Vou contactar a freira superior do Patriarcado de Pejë para lhe contar que você tirou fotos do local com o seu celular :p
    Bacana o seu texto e as fotos, mas no momento que você tirou a ultima foto, aquela da entrada do Patriarcado, acho que os soldados da KFOR resolveram se esconder porque não da para ver ninguém na entrada do local.

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